terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

O que precisamos por toda eternidade


“Exatamente porque não amamos o Senhor Deus somente por quem Ele é, estamos sujeitos a altos e baixos dependendo do que acontecer na vida. Nosso coração não fica totalmente satisfeito em Deus a não ser que outras coisas também estejam indo bem; assim, não temos raízes profundas, somos golpeados e arrastados pelos ventos de mudanças. Mas para nos tornarmos verdadeiramente ‘adoradores livres’ de Deus, alcançando a fonte de alegria, desconhecida pelo mercenário, pelo devoto religioso condicional, geralmente temos de sofrer um desnudamento. Precisamos entender que obedecer a Deus não nos trará benefício nenhum. É nesse momento que buscar, orar e obedecer a Deus começam a nos transformar.

Assim, a vida aprofundada com Deus que Jó acaba recebendo só é alcançada porque Deus não lhe contou o porquê de tanto sofrimento. Deus teria reforçado o impulso autojustificador de Jó caso lhe tivesse revelado os motivos. Em vez disso, o sofrimento leva Jó a amar e confiar em Deus simplesmente porque Ele é Deus. Jó se transforma numa pessoa de muita força e alegria, que não precisa de circunstâncias favoráveis para se manter firme espiritualmente. Isso transforma o sofrimento – ou, mais propriamente dito, os resultados do sofrimento – numa grande dádiva; e esse nível de confiança na graça de Deus muito provavelmente não seria alcançado de outra forma. Como  Francis Anderson diz, Jó nunca teve uma visão mais ampla da situação, ele viu somente o Senhor Deus. Mas, na verdade, isso é tudo de que precisamos, por toda a eternidade.”

Timothy Keller, em
Caminhando com Deus em meio à dor e ao sofrimento,
página 302

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

A história das almôndegas

“Era uma vez uma cozinha num palácio, uma das mais grandiosas que o mundo já vira. Havia panelas e frigideiras penduradas em todas as paredes e deliciosos ingredientes empilhados, esperando para serem preparados. No meio da cozinha havia uma enorme chaminé e sob ela um magnífico fogão de ferro.

Cinquenta cozinheiros trabalhavam dia e noite para preparar a comida para a mesa do rei. Havia tortas recheadas com carne de pavão, carneiros assados, churrascos e travessas e mais travessas de almôndegas, pois todos sabiam que o prato favorito do rei era almôndegas ao molho branco cremoso.

Bem, um dos cozinheiros subalternos tinha acabado de preparar a última travessa de almôndegas. Ele abriu a grande porta de ferro do forno e inseriu a travessa. O prato começou a arder enquanto a gordura derretia e a temperatura subia. O calor se tornou cada vez mais sufocante, e as almôndegas começaram a cozinhar. Elas gritaram para a sua líder: ‘Socorro, socorro, faça alguma coisa, por favor, estamos sendo cozidas vivas. Faremos qualquer coisa por você, mas precisa salvar nossa vida!’

A almôndega líder, que era a maior de todas, ergueu-se o máximo que pôde e falou às suas companheiras almôndegas: ‘Tenham fé, ó almôndegas, eu as salvarei. Prometo que não seremos cozinhadas, mas que a salvação chegará da maneira mais extraordinária!’ ‘Qual será nossa salvação, ó grande líder?’ ‘Virá um remédio refrescante para aliviar suas queimaduras e uma cama perfumada para vocês deitarem e descansarem.’

Nesse exato momento, a porta do forno foi aberta e um molho branco frio foi vertido sobre as almôndegas. Elas suspiraram de alegria e agradeceram a Deus por salvá-las do fogo terrível.

‘Vocês não me escutaram, companheiras almôndegas’, declarou a almôndega líder, ‘pois prometi um remédio refrescante e, vejam só, ele chegou’. Mas então o calor começou a aumentar novamente e algumas das almôndegas, aquelas mais perto da borda da travessa, foram assadas vivas. ‘Ó, líder’, gritaram as outras, ‘por favor, salva nossa alma. Vamos segui-la até os confins da terra. Simplesmente nos salve desde calor horrível.’ ‘Fiquem calmas, minhas almôndegas’, disse a almôndega líder. ‘Acalmem-se e o fogo resfriará. Prometo a vocês.’

Naquele momento, a porta do forno abriu novamente e a grande travessa foi cuidadosamente removida pelo cozinheiro. Ele a sacudiu um pouco, para garantir que as almôndegas não estavam grudando no fundo e virou a travessa sobre uma camada de arroz cor de açafrão. O prato estava adornado com ervas e folhas perfumadas. As almôndegas foram transportadas da cozinha pelos corredores do palácio até a sala do trono, onde o próprio rei estava jantando com seus convidados.

As almôndegas não conseguiam acreditar na virada que houve na sua sorte. ‘Eu disse a você que nossa má sorte se inverteria’, declarou a almôndega maior. ‘Só precisam acreditar em mim, pois sou a líder’. As outras almôndegas teciam elogios enquanto se ajeitavam na macia camada de arroz. Subitamente o prato foi colocado diante do próprio rei.

Algumas das almôndegas foram ofuscadas pelo brilho das joias no pescoço dos convidados, e outras foram dominadas pelo som dos músicos tocando sobre um tablado na sala.

Mas então a irmandade das almôndegas foi removida um punhado de cada vez, tiradas da travessa e servidas em pratos individuais. E, pior ainda, bocas famintas ao redor da mesa começaram a devorá-las. ‘Ó, líder, nossa líder’, gritaram as almôndegas restantes, ‘o que está acontecendo conosco? Nossas integrantes estão sendo selecionadas e da maneira mais chocante. Estamos sendo exterminadas.’

O próprio rei enfiou um garfo na travessa e perfurou seis almôndegas de uma vez. ‘Traição!’, gritaram as últimas almôndegas. ‘Como isso pode estar acontecendo conosco?’ A essa altura, a almôndega líder estava farta de ouvir sobre os problemas que suas seguidoras almôndegas estavam encarando. Ela gritou para as outras: ‘Vocês foram refrescadas pelo molho branco medicinal, não foram?’ ‘Sim, fomos sim!’, gritaram as últimas almôndegas que restavam. ‘E foram removidas do fogo terrível e colocadas sobre uma cama de arroz fresco e tranquilizante, não foram?’ ‘Sim, nós fomos!’, disseram. ‘Bem, quando vão compreender que vocês são almôndegas e que estão destinadas ao estômago de homens famintos?’

Logo em seguida, a almôndega líder foi garfada e engolida inteira pelo rei. As últimas almôndegas na travessa continuaram a gritar, berrar e protestar sua recusa a serem comidas. Mas a essa altura já não havia mais ninguém para ouvir seus gritos.”

Tahir Shah,

Em Noites Árabes,


Página 325 a 327